Pai Nosso de Papelão

Papel Nosso que foi Descartado,
Reciclado seja Reaproveitado.
Venha a nós o Saco de Cimento,
Seja feito o Reaproveitamento,
Assim da Água como do Papel.
O Papelão Nosso de Cada Dia nos daí Hoje.
Reaproveitai nossos Resíduos e Sobras
...

Assim como Reaproveitamos
O que provem de outras Obras.
E não deixeis cair Papel no chão!
Mas Livrai o Reino Vegetal.
Amém!

Carlo Damião

 




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Apresentação




A TEMPO ECO ARTE é um espaço de artes e ofícios que há mais de dez anos pesquisa e faz arte a partir da reutilização de resíduos sólidos. A especialidade é a técnica de transformar papelão e sacos de cimento usados, em objetos, móveis e peças artísticas, decorativas e utilitárias

A oficina da Tempo Eco Arte facilita vivências de (re)criação e construção artesanal a partir das propostas de reduzir, reutilizar e reciclar dentro de uma abordagem cultural, onde a educação é vista como um eixo de transmissão e formação de conhecimentos e valores, propondo um espaço de trocas de saberes informal.A construção de nossas peças tem como matéria prima resíduos sólidos descartados diariamente na cidade, a especialidade da casa é o papelão que é utilizado de diferentes formas nas diversas peças produzidas. Nos móveis e estruturas são utilizados papelões mais densos e fortes, nas peças menores como caixas e objetos decorativos é usado papelão de embalagens de eletroeletrônicos, eletrodomésticos e similares.


Com moldes e desenhos as placas de papelão são cortadas para serem encaixadas e coladas na montagem. 

Sacos de cimento são coletados e lavados com água de chuva ou de lavagem de roupas. Depois de secos eles são rasgados em diferentes formatos e fixados com cola branca diluída em todo o exterior da peça dando um revestimento resistente com várias possibilidades de acabamento.

Depois de seca a peça é lixada e encerada, e enfim esta pronta.

As peças podem receber outros materiais em sua estrutura como madeira, pvc, pet, borracha, tudo quanto é trem, todos coletados ou recebidos.

O acabamento pode adquirir diferentes expressões como de madeiras, pedras, envelhecimento e levar variadas cores.

Aqui descrevemos somente aspectos básicos e de forma simplificada de nossa tecnologia. Venha conhecer nossa oficina e trocar saberes e viveres!

TRABALHAMOS COM ENCOMENDAS, EXPOSICOES, OFICINAS, PALESTRAS...




Lixo dá ritmo e renda 


Isabela de Oliveira 
Correio Braziliense


Resíduos da Construção Civil viram matéria-prima para artesãos de Taguatinga produzirem instrumentos musicais e móveis. O saco de cimento substitui o couro animal no pandeiro, e o papelão, a madeira na confecção de cadeiras

Avenida Sandu Sul, Taguatinga, 7h. Estudantes e trabalhadores espremem-se nas paradas de ônibus. Nas pistas, automóveis impacientes disputam espaço com caminhões pesados que, a cada arrancada, deixam o rastro preto da fumaça. Em meio à poluição e ao barulho das máquinas, a música que ecoa de um discreto ateliê a poucos metros da avenida, na QSB 13, contraria o compasso febril da cidade. No seu próprio ritmo, os artesãos do Tempo Eco Arte compõem instrumentos musicais e até móveis usando materiais dispensados no lixo, como sacos de cimento e pedaços de papelão.

Orientados por Virgílio Mota, 61 anos, 13 artesãos não desperdiçam restos da Construção Civil, materiais doados ou coletados na rua. O corpo dos tambores e dos pandeiros surge do papelão, enquanto as platinelas são improvisadas com tampinhas de garrafa. Virgílio explica que o papelão é produto da celulose, substância encontrada principalmente na madeira. "Esse material reciclável e não poluente é mais resistente do que o isopor e mais leve do que a madeira. A qualidade da peça depende da forma como os módulos são encaixados, além da quantidade de cola que se usa", pontua o mestre, referindo-se também à produção dos móveis.

Em lugar do couro animal, os instrumentos são revestidos com os sacos de cimento. Primeiro, eles são lavados com água reutilizada da lavagem de roupas. Depois de secos, são fixados na tampa do instrumento e conseguem reproduzir som idêntico ao dos instrumentos originais. A textura não deixa a desejar. Virgílio explica que os sacos, produzidos com papel kraft, contêm mistura de fibras de celulose longas, oriundas de polpas de madeiras macias. Além de resistência, as fibras conferem maciez à percussão. "É, sem dúvida, um excelente material, pois suporta 50kg de cimento, além do manuseio durante o transporte", garante Virgílio.

Multiplicadores

A confecção dos instrumentos, no entanto, depende do conhecimento do artesão em música. É o caso de Juraci de Moura Matos, 38 anos, que integra o Clube do Choro de Brasília e a banda Som de Papel, que utiliza a percussão sustentável para cadenciar ritmos regionais, como o coco e o maracatu. Jura, como é conhecido no Beco da Cultura, onde mora, participa da Tempo Eco Arte há um ano, e é um multiplicador de conhecimento. Ele abriu a própria oficina, batizada de Platinelas. "Recebo muitas encomendas de pandeiro artesanal para escolas, com platinelas feitas com tampinhas de garrafa. Músicos profissionais passaram a me procurar para conhecer e encomendar o pandeiro alternativo, que pode ter oito ou 10 centímetros", conta.

Virgílio ressalta que o objetivo do grupo é divulgar o trabalho para repassá-lo a novas pessoas, que seriam multiplicadores de conhecimento. "Juraci é importante para nossa comunidade, pois ele lida diretamente com adolescentes e crianças. Além dele, duas irmãs argentinas, Luzia e Lucia, ensinam o ofício em Córdoba, na Argentina." Em 3 anos de existência, mais de 300 pessoas já passaram pelo ateliê, mas Virgílio não soube dizer quantos são multiplicadores ativos.

Atualmente, a Tempo Eco Arte não tem apoio do governo ou de instituições privadas. "Somos artistas de fato, e não de direito", explica mestre Virgílio. A oficina sobrevive da venda desses produtos, que custam até R$ 500 no mercado. "Não é por causa do valor da matéria-prima, mas pela mão de obra exigida para a confecção", conta Bruna Lenehr, artesã de 25 anos. Segundo Virgílio, os gastos mensais de cerca de R$ 1.600 são rateados por todos os integrantes.

"Antigamente, oferecíamos oficinas, mas enquanto estamos dando aulas, não produzimos as encomendas, que são o nosso verdadeiro ganha-pão", diz a artesã Rafaela Cardoso, 18 anos. Segundo ela, um grupo rentável teria que ser composto por 10 alunos, divididos em duas turmas, cada uma com duas aulas por semana.

A oficina é um ponto de terapia para a comunidade, que comparece em peso aos eventos culturais - e gratuitos - do Beco. Os laços se estreitam à medida que os artesãos emprestam ferramentas para vizinhos, fazem pequenos reparos e até mesmo cuidam das crianças cujos pais saem para trabalhar e não têm com quem deixá-las.

Personagem da Notícia

Guardião do Tempo


A história da Tempo Eco Arte começou há 61 anos na cidade baiana de Amargosa, onde nasceu Virgílio. "Aos 19 anos, decidi que queria ser peão", conta o mestre, como é chamado pelo resto do grupo. Ele ganhou o diploma por ser o mais experiente da equipe, ou como ele mesmo descreve, "por ser o guardião do Tempo", já que reside no andar de cima da loja.

O título foi oficializado há três anos pelo Ministério da Cultura, quando Virgílio foi reconhecido pelo projeto Ação Griô como um contador de histórias africanas no estúdio, um tradicional ponto de cultura. Antes de completar a segunda década de vida, ele já era um andarilho. Percorreu quase todos os estados brasileiros e conheceu diversos trabalhos. Jamais teve uma profissão, mas vários ofícios, entre eles o de mestre de obras. Chegou à capital em 1999, mas após cinco anos monitorando os canteiros de construção, decidiu entregar-se totalmente ao artesanato com a inauguração da Tempo Eco Arte. "Tempo de artesanato com reciclagem, de ser criança, pois eu estava perto da casa dos 50 anos. Eco de ecologia, mas também de ecoar, pois o nosso trabalho nasceu para ser multiplicado. A minha paixão é transformar o olhar das pessoas."

 
 
 
 UNB

Oficina incentiva o reaproveitamento de materiais

André Vaz e Pedro Menezes


O Espaço Tempo Eco Arte

Para Virgílio Mota, 61 anos, não há lugar melhor que o Espaço Tempo Eco Arte. “Já rodei esse Brasil todo. Fui da Argentina à América Central e em nenhum desses lugares encontrei o prazer que essa oficina me proporciona.” Afirma ainda: “tenho em um único lugar, minha casa, meus amigos e toda a troca de experiência possível. Isso me rejuvenesce”. Virgílio considera o Espaço Tempo Eco Arte o local ideal para a improvisação. Segundo o artesão, o local é procurado por todos os tipos de pessoas. “Recebo aqui desde estudantes a funcionários públicos, músicos, professores e interessados em arte”, ressalta.


É o caso do bancário Marcelo Ribeiro, que nos dias de folga faz questão de vir para a oficina, apesar de residir na Asa Norte. “Aqui é o lugar em que me sinto útil. Tenho toda liberdade para fazer coisas que não tenho a mínima condição de experimentar em minha atual profissão”, afirma. Já o músico Juraci Moura aproveita o Espaço Tempo Eco Arte para desenvolver um projeto musical de confecção de instrumentos de percussão com papelão e papel de saco de cimento. “Construímos aos poucos e sem pressa. Por exemplo, foram meses de estudos só para chegar à consistência e ao som certo das peles de tambores, pandeiros e alfaias”, ressalta.

Fernanda Cunha
Objetos de decoração são feitos utilizando sacos de cimento reaproveitados

 

Começo

Antes de trabalhar com arte, o baiano de Amargosa foi agricultor, motorista e trabalhou com construção civil. Foi justamente no ramo da engenharia que Virgílio começou seus trabalhos como artesão. “Comecei a pegar canos de PVC que iriam para o lixo das construtoras e percebi que davam lindos vasos de flores. Foram minhas primeiras invenções”, conta. Mas não foi fácil assumir o ofício de artesão. “Eu tinha vergonha. Trabalhar com artesanato era sinônimo de ser vagabundo. Não foi fácil ‘sair do armário’ e me assumir”, brinca.


Amador por escolha

Aos 17 anos, ainda na Bahia, Virgílio abandonou a escola, não concluindo assim, o ensino médio. “O modo de lecionar era ‘quadrado’. Não prendia minha atenção”, conta. Aos 19, tomou a decisão que até hoje enaltece: “Não iria trabalhar para ninguém. Não queria carteira assinada, nem ter que assinar a de alguém. Decidi cedo não ser um profissional. Quis sempre ser um amador e até hoje sou”. Segundo o artesão, é mais fácil lidar com problemas sem a pressão que o profissionalismo exige. “Prefiro ser um amador que faz bem feito a ser um profissional que faz mal feito”, afirma.

 

Fernanda Cunha
O bancário Marcelo Ribeiro elogia Virgílio Mota. “O velho – Virgílio- nos ensina muito com seu jeito simples de ser”, afirma 

Os mestres da vida

“Já tive vários mestres na vida. Desde doutores a analfabetos”, conta Virgílio. Mas nenhum tão importante quanto Seu Totonho Bonventura, segundo o artesão. “Era um construtor de barcos que conheci no alto do Rio Negro. Não sabia sequer escrever seu nome, mas fazia barcos para suportar 40 toneladas. Era engenharia pura e aplicada, conhecimento por si só.

 

”Experiências e técnicas aprendidas em mais de 40 anos de viagens que Virgílio leva para seu trabalho, no Espaço Tempo Eco Arte. Mas houve também o que nascesse dentro da oficina. “Tem uma ferramenta aqui que em nenhum outro lugar você vai encontrar. Como tudo aqui, também foi confeccionada reutilizando materiais”, conta, segurando à mão um pequeno cortador feito de sobras de estiletes e papelão.


O Griô do Distrito Federal

“Me considero um griô”, afirma Virgílio, referindo-se aos líderes culturais africanos responsáveis por passar conhecimentos e arte através da tradição oral. “O conhecimento ‘aprisionado’ perde todo o seu sentido. Procuro fazer do Espaço Eco Arte um terreno de aprendizado em conjunto”, conta. Tanto que não restringe a entrada de curiosos e interessados. “A palavra daqui é liberdade. Só tenho a chave da porta. E até ela eu deixo aberta, pra ninguém ficar de fora”, diz.

Arte: Isabela Bonfim